Direito Imobiliário

Da Aplicação da Tabela Progressiva no Serviço de Fornecimento e de Distribuição de Água para Condomínios

por Yasmin Braga

22 de junho de 2018

A fim de incentivar o racionamento de água, os entes que efetuam o fornecimento e distribuição de água em território nacional estabeleceram a denominada tabela progressiva, que consiste na majoração do valor do metro cúbico da água consumida, quando ultrapassados determinados patamares, instituindo, assim, as determinadas “faixas de consumo”.

Não apenas isto, a tabela progressiva também permite a cobrança de valores diferentes pelo metro cúbico consumido, a depender da finalidade a qual é destinada o imóvel, a título de exemplo, em Santa Catarina, a CASAN, empresa responsável pelo serviço público de fornecimento e distribuição de água, cobra o valor de R$ 6,22 por metro cúbico de água consumido, em imóveis destinados para o exercício de atividades comerciais[1], sendo que somado ao valor da tarifa de esgoto (que é idêntico ao do metro cúbico da água) tem-se a monta de R$ 12,44 por metro cúbico de água consumido em estabelecimento comercial.

Todavia, tal valor se mantém até que a economia consuma até 10m³ por mês, o que equivale a R$ 124,44, sendo que, se consumir de 11m³ a 50m³, a economia deverá pagar R$ 10,33 pelo metro cúbico de água e, se somado à tarifa de esgoto, tal valor sobe para R$ 20,66 e, por fim, se consumido volume superior a 50m³, o 51º metro cúbico terá valor de R$ 12,98 e, quando somado a tarifa de esgoto, equivalerá, realmente, à R$ 25,96.

Por economia se entende o grupo de quatro salas, ou fração de quatro, com instalação de água em comum, como determina o art. 96, inciso VII, do Decreto nº 553/76, ou seja, uma economia equivale a um apartamento ou uma sala comercial, também denominadas de unidades autônomas.

Ocorre que para a aplicação dos valores superiores ao original previstos na tabela progressiva seja cobrado, é necessário que a economia, de forma individual, ultrapasse os limites e, no caso trazido, tais limites equivalem a 10m³ e 50m³.

Todavia, algumas fornecedoras de água têm calculado faturas como se o condomínio fosse apenas uma economia, muito embora composto por diversas unidades autônomas.

Por exemplo, um condomínio constituído de 30 salas comerciais, tem-se que a sua tarifa mínima será equivalente ao consumo de 300m³, sendo que se for tomado em conta que nenhuma economia ultrapassou o limite de 10m³, o valor da fatura será de R$ 3.732,00 (300m³ X R$ 12,44).

Entretanto, se o condomínio for cobrado como uma única economia que tenha consumido 300m³ o cálculo é feito da seguinte forma:

1. 1m³ a 10m³, valor total de R$ 124,40 (10m³ X R$ 12,44);

2. 11m³ a 50m³, valor total de R$ 826,40 (40m³ X R$ 20,66);

3. 51m³ a 300m³, valor total de R$ 6.490,00 (250m³ X R$ 25,96).

Assim, tem-se que se o condomínio for considerado como uma única economia o valor sobe para R$ 7.440,80, ou seja, o valor da fatura é cobrado quase que em duplicidade do realmente devido, gerando nítido enriquecimento sem causa da empresa responsável pelo serviço de fornecimento e distribuição de água.

A questão ainda não foi objeto de debate pelos Tribunais Superior, através do sistema de Repercussão Geral, porém, há acórdãos dos Tribunais Estaduais que, de forma acertada, repelem a cobrança da fatura de água calculada como se o condomínio fosse uma única economia, dentre estes, há decisão bastante didática prolatada nos autos de nº 0430184-46.2012.8.19.0001 da lavra do Excelentíssimo Desembargador Werson Rêgo, vinculado ao Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Do corpo de tal decisum extrai-se:

“Tome-se por base, a título de ilustração, a alteração da tarifa mínima residencial, em sua progressividade, a cada 15m³, vale dizer, de 15m³ em 15m³, o consumidor entrará em uma nova faixa da tarifa progressiva.

Assim, a cobrança por faixa significa que, toda vez que o consumo ultrapassa determinado limite, o consumo excedente sofre a ação multiplicadora de um fator maior, o que seria abusivo.

Confira-se:

· 1ª Faixa de consumo: 15m³ (15 mil litros): fator de multiplicação R$ 1,60.

· 2ª Faixa: + 15m³ (até 30m³). Fator R$ 3,50 (120%)

· 3ª Faixa: + 15m³ (até 45m³). Fator R$ 4,81 (200%)

· 4ª Faixa: + 15m³ (até 60m³). Fator R$ 9,62 (500%)

· 5ª Faixa: acima de 60m³. Fator R$ 12,83 (700%)

Suponha-se um edifício com 10 unidades residenciais. Cada unidade representa 01 (uma) economia. Cada economia deve pagar, pelo menos, a tarifa mínima, eis que são de condôminos distintos. Sendo assim, serão 15m³ por cada economia e, como serão 10 economias, temos 15m³ x 10 economias = 150m³ até a ultrapassagem da 1ª faixa de consumo e incidência da progressividade, PARA A COLETIVIDADE.

Se cada metro cúbico de água custa, dentro da 1ª faixa de consumo, R$ 1,60, certo é que o condomínio pagará R$ 240,00 pela primeira faixa de consumo mínimo.

Considere-se, no entanto, que os condomínios não tenham utilizado toda a faixa tarifária mínima e consumido apenas 100 m³. Ao se proceder ao enquadramento tarifário do condomínio, sem considerar o número de economias, teremos a seguinte aberração:

· 1ª faixa de consumo = 15m³ -> consumo 15m³ x 1,60 = 24,00

· 2ª faixa = 15m³ a 30m³ -> consumo 15m³ x 3,50 = 52,50

· 3ª faixa = 30m³ a 45m³ -> consumo 15m³ x 4,81 = 72,15

· 4ª faixa = 45m³ a 60m³ -> consumo 15m³ x 9,62 = 144,30

· 5ª faixa = acima de 60m³ -> consumo 15m³ x 12,83 = 513,20

Total – R$ 806,15 (contra R$ 240,00 que pagaria o condomínio, se fosse o número de autonomias [10] considerado para efeito de enquadramento tarifário na primeira faixa).

Ou seja, os consumidores estariam pagando 335,895% a mais do que o justo, pelo efetivamente aferido.

(…)

Não se está discutindo, pois, nem a legalidade da tarifa progressiva, nem a multiplicação do número de economias pela tarifa mínima. O que se está a discutir é um critério equilibrado, harmônico, justo, para o enquadramento tarifário, a partir do qual incidirá a progressividade para a coletividade, em hipóteses de haver apenas um hidrômetro para aferir o consumo total de um prédio.

Desta forma, penso que razão assiste ao Autor, devendo ser considerado o número de economias do condomínio para o cálculo da faixa tarifária de consumos, multiplicando-se, após o consumo efetivamente aferido pelo valor da tarifa correspondente à faixa de consumo adequada, conforme conclusão do laudo pericial às e-fls. 496/504”.

Do estudo trazido, verifica-se que considerar o condomínio como uma única economia vai de encontro a uma das mais importantes vedações trazidas pelo Código de Defesa do Consumidor, qual seja, a que veda que do consumidor seja exigida vantagem manifestamente excessiva (art. 39, inciso V do CDC).

Em termos práticos, quando da aplicação da tabela progressiva, tem-se que, caso a empresa responsável pelo fornecimento de água local atue com a faixa mínima de 10m³, um condomínio composto de 25 apartamentos poderá consumir 0,4m³ por unidade, antes de ser aplicada a segunda faixa da tabela progressiva, ao passo que uma casa, com apenas uma pessoa morando, poderá consumir até 10m³, sem a alteração de preço no metro cúbico da água.

O cálculo tratando condomínios verticais e horizontais como uma única economia onera demasiada e desarrazoadamente os consumidores, não podendo ser admitida tal metodologia de cobrança, vez que não vai apenas de encontro às medidas protetivas do Digesto Consumerista, como também afronta o princípio constitucional da isonomia.

FONTE: ISADORAERBS17.JUSBRASIL